quinta-feira, 8 de novembro de 2012

O diagnóstico de Olavo.



O diagnóstico de Olavo.

_Recebeu todos os exames dona Célia?

Assim Márcia iniciava a conversa com a amiga que acabara de chegar do hospital.

_Sim Márcia recebi todos os exames, até mesmo aquele mais complicado, o laudo esta aqui em minha mão, mas lógico que não vou abrir.

Ouvindo a amiga, Márcia rodopéia no dedo indicador a chave da porta; grita com o vendedor picolé que vai passando:

_Ei, moço; ei moço, um picolé por favor! 

O homem que já ia embora com puro 20 reais da venda do dia inteiro, volta-se para Márcia e diz:

_Diga patroa, do que é que a senhora vai querer? Tem de uva, amendoim, limão e tamarino. Qual é o de sua preferência?

Márcia injuriada com os sabores retruca:

_ Mas senhor o senhor não tem ai um picolé mais doce, de sabores mais agradáveis?

Enquanto isso, Célia com os exames seguros pelas duas mãos os balança no ar. De forma indiferente nem se atem ao esforço de Márcia em busca de um picolé mais doce. O vendedor de picolé por sua vez, tenta encontrar dentro do carrinho de sorvetes algo que agrade ao paladar de Márcia. 

_Patroa tem um aqui de pequi, o que a senhora acha?

A mulher já sem paciência, retruca:

_O senhor me vem com picolé de pequi? Minha nossa, o mundo ta perdido, Célia você quer um picolé de pequi?

Célia olha para a amiga e aceita a iguaria. Afinal depois do diagnóstico, tanto fazia o sabor de qualquer paladar, pois o tempo se tornava estreito para se ater a sabores, o melhor era conhecer os sabores antes que o picolé derretesse e o calor do corpo se apagasse.

Márcia decidiu finalmente e escolheu o picolé de uva. Abriu o portão e chamou a amiga para entrar, ela por sua vez aceitou o convite e sentaram-se logo ali adiante no alpendre antigo da velha mansão. A conversa estava boa, entre uma mordiscada e outra no picolé. Quando notaram já haviam passado das sete horas da noite. Era hora de dona de casa ir pra casa esperar marido, afinal a janta tinha que estar pronta quando Olavo chegasse.

_Fique um pouco mais Célia! está cedo, Justos ainda não apareceu, estou certa que Olavo também ainda não há de ter chegado, fique um pouco mais!

Célia apanhou a bolsa e os exames que estavam em cima da mureta do alpendre e se justificou.

_Tenho que dar o Diagnóstico a Olavo; não posso ficar mais Márcia, ele já está para chegar é hora de janta, quem tem marido sabe, você sabe; se o Justos chega e a janta não ta pronta é um Deus nós acuda.
Ambas sorriram, e se despendido Márcia perguntou mais uma vez:

_E os exames, num vai me falar o que deu?

_Falo sim Márcia, mas quando eu for fazer o tratamento, por enquanto e segredo médico!

Assim Célia desceu a rua. Uma ladeira acentuada, com buracos de chuva no asfalto, um lugar desleixado para o porte que tinha na boca do povo. Tratava-se da Rua do Cristo, merecia melhor respeito e manutenção; a tão esburacada rua que ninguém fazia questão de manter viva desde a inauguração.

Ao chegar em casa Célia percebeu que Olavo ainda não havia chegado. Se dirigiu ao quarto e em momento solene de profunda solidão, desabafou; escorreu lágrimas nós olhos e fez planos para ontem. Era tudo tão rápido e tão pequeno que até mesmo a penteadeira já não importava mais, ela, ficaria ali, sempre imóvel até o dia em que alguém lhe movesse. Era doloroso pensar naqueles papeis horríveis que guardou na gaveta de sua penteadeira.

Enquanto sofria o silêncio dos papeis de sua vida, mergulhou em pensamento nós braços de Olavo! Iria abraça-lo com toda força deste mundo quando ele adentra-se aquela porta. E por ele esperou.
Foi quando a porta de súbito se abre e entra Olavo com um jogo de colheres na mão, as atira sobre a cama e diz:

_Vê se num some mais com estas colheres, pois a gente vai comer e não acha uma colher nessa casa!

Ao ouvir as palavras de Olavo que espera atencioso pelo diagnóstico, pois sabia da consulta de Célia; Ela simplesmente enxugou as lágrimas, olhou-o nós olhos e disse:

_Um estúpido, um mal educado, um homem do tipo que merece ter sempre inúmeras mulheres, pois és tu incapaz de dar felicidade a uma única que seja, pois é teu  o diagnóstico; de homem para não se partilhar uma vida. Ainda bem que, pra sempre sempre acaba!

Naquela noite não houve jantar. 
E pela manhã, o doutor Marcus já estava com o melhor dos remédios:
 _ Te amo!

OS CONTOS SECRETOS) O diagnóstico de Olavo . Ano de 2001.

Parabéns, você descobriu este conto!

OBS: Este trabalho faz parte da série de contos que escrevo. Descrevendo conclusões e comportamentos sociais. Sei que algumas pessoas já conhecesse o meu trabalho (e até mesmo este conto). Mas hoje, quero compartilhar com todos vocês que visitam minha página, e pouco conhecem de minha escrita comportamental, posto que aqui, publico mais meus artigos, ensaios.

Um grande abraço a todos!

4 comentários:

Francísio Nobre de Jesus disse...

Quem não pode enxergar a belaza e a vida contida no íntimo do ser, não conseguirá amar, muito menos pronunciar e admitir essa condição. A cegueira que destrói e traz as perdas não é a física, mas a cegueira da alma (ser/vida). Boa noite e um grande abraço.

Bento Sales disse...

Olá, grande amiga Luciene!
O conto está muito bem inspirado e engendrado. A descrição das cenas corriqueiras (como a do picolé)dá maior veracidade à história.
O suspense e a curiosidade sobre o resultado do exame de Olavo (sobrevivente)nos prende ao enredo até o fim. Célia nos distrai com suas ações cotidianas, mas nós não olvidamos do diagnóstico de Olavo.
O epílogo nos foi surpreendente.
Ótimo assim!

Parabéns, amiga pela virtuosidade!

Abraços fraternos.

Louraini Christmann - Lola disse...

Sensibilidade.
Criatividade.
Encontrei aqui.
Voltarei.

Luciene Rroques disse...

Grata pelas palavras Lola.
Seja sempre muito bem vinda.
Um grande abraço!